A Brassagem é sem dúvida uma das partes mais importantes do processo quente da produção da cerveja artesanal. E quando estamos começando nesse maravilhoso hobby de Fazer Cerveja em Casa, procuramos seguir uma receita e quando seguida à risca podemos obtemos ótimos resultados…
Mas, entender as nuances da brassagem lhe permitirá dominar as características desta etapa e ficar atento a qualquer modificação que se faça necessária durante o fabrico.
O objetivo da brassagem ou mosturação é ativar as enzimas contidas no malte através do cozimento dos grãos em água quente, para que assim, elas possam converter o amido contido no malte em açúcares fermentáveis (maltose) e não-fermentáveis (dextrinas), constituindo o mosto cervejeiro.
Além disso, vale ressaltar que cada grupo de enzimas é favorecido conforme a temperatura e o pH da água, e saber como usar cada uma dessas características é fundamental para atingir os objetivos buscados em sua receita.
Assim, para começarmos a conversar um pouco mais sobre essa etapa do processo de fabricação da sua cerveja, vamos conversar um pouco sobre a…
Quantidade de Malte para a Brassagem
A quantidade de malte a ser utilizada está intimamente ligada à densidade inicial que se deseja atingir, assim como à quantidade em litros que se deseja fabricar.
Existem alguns cálculos que são utilizados para saber a quantidade ideal de malte a ser utilizado com o intuito de se obter uma determinada densidade inicial, porém, para te auxiliar nesses cálculos – principalmente no começo – aconselho utilizar algum software cervejeiro, tal como Beersmith ou BeerTarget, que o fazem automaticamente assim que a quantidade de malte é adicionada.
Quantidade ideal de Água na Brassagem
A quantidade ideal de água para a brassagem é uma proporção entre 2 à 4 litros de água para cada kg de malte, mas observe que isso é uma média…
Dependendo do tipo de cerveja que esteja produzindo esses valores podem variar.
E no post abaixo você poderá aprender mais sobre como calcular a quantidade de água para a brassagem:
Como Calcular a Quantidade de Água Para a Brassagem
Na escolha das medidas é fundamental que se leve em consideração que quanto maior a quantidade de água mais dispersa as enzimas ficarão, diminuindo assim sua atuação constante sobre o amido do malte.
Portanto, uma proporção entre 2 à 4 litros de água para cada kg de malte é a mais indicada.
Faixas de Temperaturas
Como citado anteriormente, cada grupo de enzimas é ativado de acordo com a temperatura da mosturação, sendo as enzimas alfa-amilase e beta-amiliase as enzimas responsáveis pela formação dos açúcares do mosto.
Temperaturas mais altas, entre 67 a 72ºC, são favoráveis para a atuação das enzimas responsáveis pela formação de açúcares mais complexos (as dextrinas), não fermentadas pelas leveduras. Enquanto que temperaturas mais baixas, entre 62 a 66ºC, contribuem para a atuação das enzimas com o poder de conversão dos amidos em açúcares fermentáveis.
Todas as reservas de amido contidas nos grãos, ficam fechadas em matrizes de proteína/carboidratos que dificultam a conversão desses amidos pelas enzimas, tornando fatídica a necessidade de moer os grãos, para que assim, se possa hidratá-los durante a brassagem. Os amidos atingem 90% de solubilização a 45,5ºC, podendo atingir sua solubilidade máxima a 65ºC.
Confira as principais enzimas e qual a temperatura e pH ideal para sua atuação:
Enzima | Melhor feixa de temperatura | Escala de PH | Função |
Fitase | 30-52 °C | 5.0-5.5 | Reduz o pH da mostura. |
Debranching (var.) | 35-45 °C | 5.0-5.8 | Solubilização de amidos. |
Beta glucanase | 35-45 °C | 4.5-5.5 | Facilita a quebra do amido. Indicado para utilização de cereais não maltados. |
Peptidase | 45-55 °C | 4.6-5.3 | Produz maior quantidade de proteínas solúveis no mosto. |
Protease | 45-55 °C | 4.6-5.3 | Quebra proteínas grandes que formam a turbidez na cerveja |
Beta Amilase | 55-65 °C | 5.0-5.5 | Produz maltose. |
Alfa Amilase | 67-72 °C | 5.3-5.7 | Produz uma variedade de açúcares, incluindo a maltose. |
As faixas de temperaturas apresentadas são as indicadas para a ação e atuação das enzimas, de forma que perdem sua eficiência conforme a temperatura é elevada.
Dentre as faixas apresentadas, preocupe-se em controlar sua brassagem de acordo com a atuação das enzimas alfa e beta-amiliase, pois, devido às modificações dos maltes vendidos atualmente, é possível simplificar nosso processo de mosturação. Exceto se estiver fabricando uma Weiss, onde se recomenda uma parada a 45ºC para a formação do ácido ferúlico que proporcionará os aromas de cravo, típico desse estilo.
Como podemos observar na tabela acima, a atuação da enzima também está intimamente ligada com o valor do pH da mostura, sendo a faixa entre 5 a 5,5 ideal para a ação enzimática.
Como vimos, devido às modificações dos maltes é possível chegar ao patamar ideal de pH da mosturação apenas com a adição dos grãos. Mas caso esteja numa faixa fora do indicado você poderá efetuar sua devida correção, conforme orientado no post: A Água Cervejeira.
Sacarificação
Com o conceito enzimático definido, podemos passar para a próxima etapa: a Sacarificação. Esta etapa consiste em converter os amidos em açúcares, fermentáveis ou não, através da atuação das enzimas alfa e beta-amilase.
A enzima beta-amilase trabalha melhor a uma temperatura entre 55-66ºC e pH na faixa de 5,1 a 5,3, convertendo o amido em açúcares fermentáveis e criando um perfil mais seco (menos corpo) e mais alcoólico à cerveja. Esta enzima tende a perder sua eficiência quando atinge uma temperatura acima de 70ºC, sendo 62ºC a temperatura ideal para sua atuação.
Já a alfa-amilase é favorecia por uma temperatura entre 68 a 73ºC e pH de 5,3, onde as grandes moléculas de amido são quebradas em açúcares não fermentáveis, proporcionando uma cerveja mais encorpada e menos alcoólica. Em temperaturas acima de 75ºC pode ocorrer a inativação desta enzima. A utilização dessa parada dependerá do estilo de cerveja escolhido.
O tempo de parada dedicado a cada uma dessas faixas de temperatura irá proporcionar um perfil diferente para a cerveja, ou seja, se você fizer uma parada de 60 minutos a 62ºC e 20 minutos a 70ºC, irá produzir uma cerveja mais fermentável que encorpada, e vice-versa.
O ideal é saber o perfil do estilo que se deseja atingir para depois definir o tempo em cada uma das paradas. Ou, se preferir, poderá trabalhar com uma temperatura que beneficia ambas as enzimas, como veremos abaixo.
Mantendo o “mash” a uma temperatura entre 66 a 69ºC ambas as enzimas serão beneficiadas, podendo ser usado na maioria dos estilo de cerveja. Como parâmetro, pode-se utilizar esse método tendo em vista que, se caso busque uma cerveja mais seca, deve-se manter a temperatura próxima a 66ºC e caso queira mais encorpada, próxima a 69ºC. Ou, se preferir a atuação concomitante das enzimas, alfa e beta-amilase, faça uma parada a 68ºC.
O tempo adequado para manter-se nessa faixa de temperatura é de aproximadamente 1 hora, ao final desse tempo deve-se fazer o teste do iodo para verificar se a conversão do amido em açúcares está concluída.
Como fazer corretamente o Teste do Iodo
O teste do iodo consiste basicamente em coletar uma pequena quantidade de mosto e misturá-la com algumas gotas de iodo. Se a conversão não tiver completa, o iodo reagirá com o amido, ficando numa coloração escura. Se isso acontecer, deixe por mais um tempo na sacarificação. Repita esse teste após 15 minutos ou até que o iodo não reaja com o mosto, ficando a mistura da cor do iodo.
Observe que qualquer partícula do bagaço do malte poderá comprometer o teste indicando que a conversão ainda não está completa, portanto, ao coletar o mosto atente-se para não deixar qualquer resquício de bagaço na hora que for misturar com o iodo.
Mash Out
Com a total conversão do amido em açúcares, é recomendável que se faça a inativação das enzimas por meio de um processo chamado mash out, que consiste em subir a temperatura do “mash” para 75 a 79ºC, e mantê-la por um período de 10 minutos.
Dicas Importantes na Etapa de Brassagem
– Durante a brassagem é fundamental que se mexa ou recircule o mosto para facilitar a ação enzimática.
– Enquanto o fogo estiver ligado, mexa constantemente a mistura para evitar que ocorra a caramelização do malte no fundo da panela.
– Procure subir a temperatura durante as paradas numa proporção de 1ºC a cada 1 minuto.
Agora que você começou a parte divertida da fabricação da sua cerveja, não se acanhe! Comente…
Referências
How To Brew
Henrik Boden
Gräbenwasser
Olá tudo bem? Gostaria de saber se a parada proteica atua da mesma maneira em todas as receitas? Fiz uma APA recentemente e não utilizei nenhum malte de trigo ou aveia, então não fiz a parada proteica. Eu poderia ter feito? Teria o mesmo efeito? Utilizei malte pilsen agraria e carapils. Desde já agradeço.
Olá Marzo,
Devido as modificações e melhorias nos maltes vendidos atualmente, não tem a necessidade de se fazer uma parada proteica em todas as receitas, sendo uma ótima opção somente nos casos onde se utiliza muitos grãos ricos em proteínas.
Forte abraço e ótimas cervejas.
Boa tarde, parabéns pelo blog, vou me basear nele para fazer a minha 1º leva sabado que vem. Me surgiu uma duvida, o teste do iodo pode ser feito com o IODOFOR da sanitização ou tem um iodo especifico? Desde já agradeço.
Olá Renato,
Muito obrigado 🙂
E meus parabéns por iniciar essa tua jornada cervejeira!
Quanto a sua dúvida, pode sim, sem problema.
Forte abraço e ótimas cervejas.
otimo site de aprendizado parabens, muitas duvidas sendo esclarecidas aqui!!!!
Obrigado, Jefferson! 😉
Forte abraço e ótimas cervejas.